Este meu esforço em resgatar um passado tão sofrido, mas muito belo, começou desde quando fui ao encontro de Marina Ramalho Santana, que nos deixou registrado o livro Monsenhor Alonso – Cidadão Guanduense, em setembro de 2003.
Em seguida fui procurar também o Sebastião H. Sobrinho que nos agraciou com sua bela obra Pe. Alonso – Lição de Vida no 90º Aniversário de nascimento de Monsenhor Alonso aos 15 de fevereiro de 2005. Nesta obra encontra-se os testemunhos do Dom Geraldo Lyrio Rocha (Arcebispo de Mariana – Um homem de Deus voltado para os pobres); Dom Antônio Affonso de Miranda, sdn (Bispo Emérito de Taubaté – SP – Meu colega rachador de lenha) e de Dra Ruth de Albuquerque Tavares, (presbítera, esposa do Pastor Eliézer Tavares de Jesus, ambos da Igreja Presbiteriana Unida – Padre Alonso acolhendo o diferente – sensível ao ecumenismo).
Este meu pequeno trabalho é o meu presente a todos os Milicianos e Milicianas na comemoração dos 60º anos de fundação de nosso Instituto. Fizemos questão de que a Celebração Eucarística de Ação de Graças fosse celebrada na Igreja Matriz de São Pedro em Baixo Guandu – berço de nossa Família Religiosa onde está sepultado nosso Pai-fundador, aguardando a feliz ressurreição.
Presidiu esta concelebração o bispo da Diocese de Colatina, Dom Décio Sossai Zandonade, hoje bispo emérito. No encerramento da Celebração deixei brotar de meu coração estas palavras:
Grandes coisas fez o Senhor por nós, por isso estamos alegres! (Sl 123,3). Aqui estamos reunidos para render graças ao Senhor e deixar sair de nosso coração, como uma suave melodia: Obrigado Monsenhor Alonso!
Sou um privilegiado por ter bebido na fonte. Sinto, como se fosse ainda hoje, ainda agora, aquela voz que me perguntava: “você quer ser padre? Vamos para Baixo Guandu, lá temos uma congregação nova – A Milícia de Cristo”.
E já se passaram 55 anos. Porque quis seguir este chamado? Por que me encantei por aquele homem? Posso afirmar que não foi a sua batina, que era sinal de um homem do sagrado, mas foi o seu jeito meigo, muito humilde, bastante acolhedor, ainda que com um sorriso tímido. Monsenhor Alonso, até o final de sua vida sempre esteve rodeado de jovens, como um ímã que atrai o metal. Por que será? De futebol não entendia nada; gírias próprias dos jovens ele não sabia; das umas boas gargalhadas, muito menos; Música? Só sertaneja, e que nunca fez o gênero da juventude.
Não tenhamos dúvidas, ele atraía pela sua mansidão, pelo seu calor paterno, por sua conversa que sempre girava em torno de sinalizações para que os jovens pudessem acreditar neles mesmos, evitar o mal e dar uma boa contribuição para um mundo melhor.
Sem qualquer sentimentalismo, fanatismo ou ufania podemos afirmar: “Por Baixo Guandu passou um santo homem, ou melhor, um homem santo”. Ainda tão jovem, com apenas 07 anos de sacerdócio, o Senhor lhe fez o apelo que humanamente seria inteiramente impossível de ser correspondido. Na certa, foi possível, pois a sua entrega, nas mãos de Deus foi radical, um despojamento total e, por isso, então, há 60 anos ele depositou no Coração de Jesus a nossa Família – A Milícia de Cristo.
Sim, ele queria um Exército e queria que este Exército lutasse sempre e somente com duas espadas: a espada do amor e a espada da caridade. Um exercito que vencesse a batalha, principalmente da discriminação, para acolher a todos, inclusive o diferente, para poder concretizar a vontade do Pai: “que todos sejam um” (Jo 17,21).
Não seria nesta noite que eu esgotaria as minhas palavras sobre o perfil de nosso pai-fundador. Seu perfil dá uma grande biblioteca. Não basta conhecer seu perfil, não basta celebrar, não basta festejar os sessenta anos,..., é preciso deixarmo-nos ser questionados. Nós, seus filhos e filhas, o que temos feito, ou ainda, o que precisamos fazer para sermos reconhecidos como filhos e filhas espirituais de Monsenhor Alonso? Não basta sermos identificados como Milicianos, Milicianas, mas sim sermos recolhecidos como aqueles e aquelas que receberam de Monsenhor Alonso o legado do Carisma do Acolhimento, e para isso precisamos, a cada dia, tomarmos as mesmas atitudes e termos os mesmos gestos daquele que nos legou este Carisma. Sermos assim, seus continuadores.
Quero lembrar uma Campanha da Fraternidade: “e a Família, como vai?” “Comece em casa a vida em fraternidade”. É uma ilusão pensarmos que basta pregar. Só poderemos pregar depois que fizermos realmente, em nosso meio a experiência do acolhimento. Só poderemos pregar depois que, entre nós, estivermos crescendo na espiritualidade da unidade, só poderemos pregar quando se tornar uma realidade concreta, em nossas comunidades, o nosso lema: vivendo “o amor e a caridade”, fazendo a experiência de Deus em nossa vida.
Estejamos certos: os fundadores, portanto também o nosso Pai-fundador, não tiveram a inspiração carismática de suas Famílias Religiosas com o objetivo de aumentar o clero e assim suprir as necessidades das dioceses assumindo paróquias. Para isto, bastava ser trabalhada a dimensão vocacional para o diocesano. Não optamos pela Vida Religiosa para assumirmos paróquias, e hoje, ainda mais, não optamos pela Vida Religiosa, como Irmãos e Irmãs, para conduzir obras sociais. As paróquias deveriam ser assistidas pelos sacerdotes diocesanos e a assistência social é dever das autoridades governamentais ou mesmo de associações leigas que radicalizam em suas vidas a solidariedade e a fraternidade cristãs.
É óbvio que, se isto acontece, é pela carência tanto de uma como de outra parte, tanto das dioceses como da própria assistência social. Portanto, uma Congregação, ou um Instituto Religioso só tem sentido em uma Igreja Particular para enriquecê-la na vivência do seu Carisma.
Fomos chamados, nós os religiosos, para algo diferente. Homens e mulheres, optamos por uma vida fraterna, uma vida em comunidade com um só desejo: sermos santos. Para sermos homens santos e mulheres santas. O que dá sentido à nossa vida cristã é a seqüela Christi, ou seja, o seguimento radical de Jesus Cristo segundo o seu Evangelho, em uma vida fraterna e despojada, uns para com os outros sem compensações de qualquer espécie, a partir de um carisma específico, comum a todos. O Papa João Paulo II na sua Encíclica sobre a Vida Consagrada diz que somos “semelhantes a uma planta com muitos ramos, que assenta suas raízes sobre o Evangelho e produz frutos abundantes em cada estação da Igreja.” E ainda disse: “Que riqueza extraordinária... a multidão de fundadores e fundadoras, santos e santas, que escolheram seguir a Cristo na radicalidade do Evangelho e no serviço fraterno, especialmente a favor dos pobres e abandonos. Precisamente, neste caráter unitário do mandamento do amor, na sua conexão indivisível entre a amor a Deus e o amor ao próximo” (VC, 5). A Vida Religiosa deve ser vista como dom, e se é dom, é presente de Deus.
Estamos em festa de aniversário. E uma festa de aniversário sem presente... não é festa. Hoje, o presente de cada miliciano, de cada miliciana deve ser o propósito de FIDELIDADE e que todos nós tenhamos como modelo dessa fidelidade, a figura de Madre Maria do Sagrado Coração.
Baixo Guandu é uma cidade santa, ainda que muitos guanduenses não percebam. É santa porque um homem aqui viveu e deu a sua vida a serviço do Pai e aqui neste chão está sepultado aguardando a Feliz Ressurreição. Não foi Monsenhor Alonso que escolheu Baixo Guandu, portanto não fomos nós que determinamos o início de nossa Família Religiosa nesta pequena cidade, mas realizou-se a vontade de Deus.
Assim como Jesus insistiu com Pedro: “Tu me amas?” e obteve como resposta sincera: “Senhor, tu sabes tudo, tu sabes que eu te amo” (cf. Jo 21,17). Se Monsenhor Alonso, neste instante me indagasse se eu amo a obra que ele fundou, eu responderia, de prontidão: “Monsenhor, tu sabes..., tu sabes que eu AMO INCONDICIONALMENTE A MILÍCIA DE CRISTO”.
Baixo Guandu, 08 de maio de 2008
60 anos de Fundação do Instituto Milícia de Cristo